SOLOS - SUBSTÂNCIA FEMININA
“Os historiadores nunca se preocuparam em colocar as mulheres como sujeitos históricos.”
Marysa Navarro. Historiadora.
Feminino é um adjetivo
relativo a mulheres ou próprio delas, e substância está relacionada à matéria
de que é formado um corpo, logo substância feminina fala não somente sobre a
identidade da mulher em seu corpo físico, mas também na construção do seu papel
social e como essa construção determina inúmeros conflitos e contradições. A
questão feminina é alvo de diversas posições históricas que colocam a mulher em
posição diferenciada a do homem, dentre as quais muitas ainda não foram
desconstruídas, e são essas construções sociais que SOLOS – SUBSTÂNCIA FEMININA
vem debater, tomando como ponto de partida para essa reflexão, o território
físico, pessoal e social do corpo da mulher. A escolha de colocar em
diálogo crítico o feminino como identidade e o feminismo como posicionamento
político, partiu do estudo cênico do conto A MULHER QUE CONVERSAVA COM A LUA,
retirado da obra O LIVRO DOS PEQUENOS MISTÉRIOS. Essa narrativa traz à cena,
tendo o corpo da mulher como mediador e narrador, uma essência feminina quase
selvagem de profunda relação com o mundo natural entrando em choque com o
histórico de um universo feminino socialmente desigual.
“Quem
é feminista e não é de esquerda, carece de estratégia. Quem é de esquerda e não
é feminista, carece de profundidade”.
Rosa
Luxemburgo – Jornalista, Revolucionária.
O Movimento Feminista
vem ganhando espaço e rediscutindo questões naturalizadas. A
mulher vem construindo, a dores e ardores, o seu espaço em sociedade, desde o
século XIX com o embrião colocado pela Revolução Francesa, quando só os homens
eram englobados pelo ideal de “Liberdade, Igualdade e Fraternidade". Nesse
período, destacamos o papel pioneiro de Olympe de Gouges, jornalista e
revolucionária que esteve presente na queda da Bastilha e que por não se sentir
representada na Declaração Universal dos Direitos do Homem, foi decapitada como
traidora da revolução por escrever a Declaração Universal dos Direitos das
Mulheres. Passando pelo século XX e pela luta das sufragistas em todo mundo
além do ativo papel das mulheres nos inúmeros conflitos ideológicos do início
do século como a Revolução Mexicana e a Guerra Civil Espanhola. No Brasil, é
destacável a importância da conquista do voto feminino em 1934. No pós guerra
europeu, Simone de Beauvoir já escrevia “Não
se nasce mulher. Torna-se”; a inevitável
sentença que colocava definitivamente a mulher em outro lugar social aos
olhos sempre conservadores do
academicismo ocidental, alimentando a chama para o surgimento dos movimentos
feministas dos anos 60. Na América do Sul, Violeta Parra e Mercedes Sosa
transformaram seus cantos em hinos de resistência contra as inúmeras ditaduras
latino-americanas...O caminho trilhado pelo feminismo é árduo e contínuo,
marcado por ícones artísticos importantes. Um desses ícones é Frida Kahlo. A
artista foi escolhida pelo coletivo EN LA BARCA JORNADAS TEATRAIS como uma das
referências para esse trabalho não somente por sua arte e seu papel social, mas
principalmente, por sua especificidade de artista latino-americana. É
importante escolhermos mulheres que questionam e repensam identidades e papéis
sociais com origens mais próximas de nós. O tempo é de resgatar histórias, defender conquistas e de lutar por direitos iguais a ambos os sexos.
"Pinto a mim mesma porque sou quem conheço melhor."
Frida Kahlo - Pintora, Comunista.
O teatro comprometido com seu tempo busca problematizar questões que estão dentro de uma memória comum, resgatando-as de um esfacelamento social e desenvolvendo a sensibilidade do pensamento de homens e mulheres. É importante exercê-lo como mecanismo de interlocução sobre questões sociais, dando voz a públicos e espaços diversos; e com isso diminuir ao máximo o estrangulamento que produções artísticas independentes vêm sofrendo num campo de grandes projetos onde o fazer teatral é reduzido à mercadoria. Vivemos em uma sociedade vinculada a leis que incentivam prioritariamente produções cujo objetivo como teatro não está evidentemente claro. O teatro que defendemos faz a análise crítica e a exposição de situações sociais inter-humanas como caminho para a construção de cidadanias. Essa preocupação não se encontra na maior parte das grandes produções, que se transformam em grandes entretenimentos. O coletivo EN LA BARCA rompe com a premissa mercadológica e se irmana com outros coletivos teatrais igualmente comprometidos, inserindo no contexto teatral situações sociais que não são de fácil discussão e veiculação, trazendo à cena questões fundamentais que são restritas, muitas vezes, a artigos acadêmicos e a pequenos espaços e grupos. O teatro não pode estar reduzido a limitações do mercado cultural capitalista por se tratar de uma arte de todos e para todos. O nosso fazer teatral de guerrilha procura dar voz à questão feminina e feminista também na disposição de ocupar artisticamente espaços alternativos que dialoguem com o nosso projeto e com o discurso sócio-político que defendemos. Em SOLOS - Substância Feminina a escolha por um espaço para apresentação não parte do princípio das condições ideais de uma caixa preta tradicional, mas sim, das condições mínimas para que as cenas sejam feitas dentro de uma preocupação de democratização dos bens culturais também na relação com novos espaços alternativos. Por isso a escolha por não definir um espaço cênico ideal para a cena. Partimos do princípio de estar levando este projeto a vários lugares e de levar a experiência teatral a públicos diversificados. As atrizes constroem ao longo das narrativas corporais, conjuntamente com o público, um espaço cênico comum que é compartilhado ao longo de toda a apresentação, um espaço cênico onde o público é estimulado a participar, a pensar e refletir. As escolhas cênicas do coletivo EN LA BARCA estão inseridas numa preocupação que pretende um teatro também fora de espaços formais, como meio de comunicação, discussão e propagação de questões sociais que continuam distantes dos grandes teatros e das grandes produções.
“O processo dramático se dá entre os corpos enquanto que o processo pós-dramático se dá no corpo. No lugar do drama como meio de complexa e simbólica representação de conflitos, encontra-se a vertigem corporal dos gestos. Mariana Lima Muniz – Pesquisadora, Atriz, Diretora
SOLOS - SUBSTÂNCIA FEMININA é fruto de dois anos de estudo e treinamento continuado sobre o corpo do ator como discurso narrativo na cena; tendo como eixos de pesquisa, os princípios da biomecânica de Meyerhold e a obra de Pina Bausch, e surgiu da criação de dois solos-narrativos em formato de esquete - ESTUDO PARA PEQUENOS MISTÉRIOS e MANIFESTO DA MENINA SEM NOME. O cerne dessa pesquisa está na busca de um teatro ao mesmo tempo sensorial, narrativo e político que devolva ao público um lugar de espectador ativo e resgate a potência do diálogo artista-platéia através do conceito do público como o quarto criador teatral. Dentro da lógica do performer-narrador, e longe da ótica da criação de personagens, a atriz propõe um jogo físico-cênico que coloca a artista em um lugar de criação radicalmente autoral, tanto na criação das imagens corporais, quanto no diálogo dramatúrgico A relação literatura-teatro / palavra-teatro é feita a partir da investigação corporal e encontra desdobramentos, re-significações e aprofundamentos na construção, desconstrução e repetição de partituras corporais, criadas em um diálogo entre o universo da dança contemporânea e o universo clownesco. Nessa livre autoralidade, utiliza o recurso do depoimento pessoal deixando que suas próprias histórias e a de outras mulheres, dialoguem com a história narrada. Como mediadora desse debate cênico e por meio das histórias pessoais, a atriz-mulher-cidadã coloca em debate inúmeras construções sociais que estão presentes na sua formação. Sempre transitando entre o feminino como identidade e o feminismo como posicionamento político.
"Pinto a mim mesma porque sou quem conheço melhor."
Frida Kahlo - Pintora, Comunista.
O teatro comprometido com seu tempo busca problematizar questões que estão dentro de uma memória comum, resgatando-as de um esfacelamento social e desenvolvendo a sensibilidade do pensamento de homens e mulheres. É importante exercê-lo como mecanismo de interlocução sobre questões sociais, dando voz a públicos e espaços diversos; e com isso diminuir ao máximo o estrangulamento que produções artísticas independentes vêm sofrendo num campo de grandes projetos onde o fazer teatral é reduzido à mercadoria. Vivemos em uma sociedade vinculada a leis que incentivam prioritariamente produções cujo objetivo como teatro não está evidentemente claro. O teatro que defendemos faz a análise crítica e a exposição de situações sociais inter-humanas como caminho para a construção de cidadanias. Essa preocupação não se encontra na maior parte das grandes produções, que se transformam em grandes entretenimentos. O coletivo EN LA BARCA rompe com a premissa mercadológica e se irmana com outros coletivos teatrais igualmente comprometidos, inserindo no contexto teatral situações sociais que não são de fácil discussão e veiculação, trazendo à cena questões fundamentais que são restritas, muitas vezes, a artigos acadêmicos e a pequenos espaços e grupos. O teatro não pode estar reduzido a limitações do mercado cultural capitalista por se tratar de uma arte de todos e para todos. O nosso fazer teatral de guerrilha procura dar voz à questão feminina e feminista também na disposição de ocupar artisticamente espaços alternativos que dialoguem com o nosso projeto e com o discurso sócio-político que defendemos. Em SOLOS - Substância Feminina a escolha por um espaço para apresentação não parte do princípio das condições ideais de uma caixa preta tradicional, mas sim, das condições mínimas para que as cenas sejam feitas dentro de uma preocupação de democratização dos bens culturais também na relação com novos espaços alternativos. Por isso a escolha por não definir um espaço cênico ideal para a cena. Partimos do princípio de estar levando este projeto a vários lugares e de levar a experiência teatral a públicos diversificados. As atrizes constroem ao longo das narrativas corporais, conjuntamente com o público, um espaço cênico comum que é compartilhado ao longo de toda a apresentação, um espaço cênico onde o público é estimulado a participar, a pensar e refletir. As escolhas cênicas do coletivo EN LA BARCA estão inseridas numa preocupação que pretende um teatro também fora de espaços formais, como meio de comunicação, discussão e propagação de questões sociais que continuam distantes dos grandes teatros e das grandes produções.
“Fazemos
um teatro de resistência. A única garantia que o grupo dá é a de continuidade
artística. Mas a sobrevivência é penosa. E a situação de um artista fora do
grupo é mais custosa ainda, pois ele não tem domínio do seu projeto artístico.”
Miriam Rinaldi – Atriz – Teatro da Vertigem
Reflexão escrita em
fevereiro de 2016 por:
ANNA
FERNANDA CORREA SOARES – Atriz. Historiadora. Figurinista.
Coordenadora da EN
LA BARCA JORNADAS TEATRAIS
BRUNO
PEIXOTO CORDEIRO. Ator. Escritor. Iluminador.
Coordenador da EN LA BARCA
JORNADAS TEATRIAS
Frida Khalo ao lado de DUAS FRIDAS, uma de suas obras mais célebres. |
Frida Khalo no auge da sua maturidade artística |
Frida Khalo no início da sua militância |
Rosa Luxemburgo, uma das maiores revolucionárias do início do século XX. |
Pina Bausch, uma das grandes referências artísticas desse trabalho. |
Comentários
Postar um comentário